Advogada do tráfico no RJ diz cobrar ao menos R$ 300 mil por caso

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O escritório de paredes pretas no quarto andar de um prédio comercial na avenida Graça Aranha, centro do Rio de Janeiro, cheira a perfume doce e tem temperatura de geladeira. Condição pouco confortável para um nariz que sofre com uma recente rinoplastia. Mas Flávia Pinheiro Fróes, dona do nariz e advogada criminal a frente do lugar, é acostumada aos pós-operatórios, ar-condicionados exagerados e adversidades de toda espécie.

(Quase) tudo e “especialmente as pequenices”, ela diz, “ficam torpes” para uma mulher que tem no currículo trabalhar nas defesas dos maiores traficantes do país – o que inclui entrar frequentemente em presídios de segurança máxima que abrigam presos de alta periculosidade e ter trânsito livre e protegido em qualquer favela carioca. Tudo parte fundamental do trabalho. Flávia sobe o morro para investigar as mortes que caem na conta de seus clientes – e, garante, é das poucas na cidade que se presta a isso sem ter receio da pecha de “defensora da criminalidade tosca” – e visita cadeias para fechar contratos e checar a saúde dos contratantes. Esta última função não está nos seus honorários, mas realiza quando cria afeto por alguns deles. “Um sujeito preso em uma cadeia federal sobrevive à base de solidão, livros e Rivotril. Isso muda o cara, envelhece, tira a vida aos poucos. É muito evidente que ele não vai melhorar. E que tente fazer coisas ruins por revolta”, conta, lembrando de um cliente antigo, Márcio dos Santos Nepomuceno, o Marcinho VP, apontado como uma das lideranças da facção carioca Comando Vermelho. Condenado a 36 anos, ele está preso há 23, sendo a última metade deles passada na penitenciária de segurança máxima de Catanduvas, no Paraná.

 

Filha de um representante comercial e uma dona de casa formada em letras, Flávia, que tem 44 anos, nasceu no Espírito Santo durante uma viagem de férias da família, mas cresceu na Tijuca, bairro da Zona Norte da capital fluminense, junto de outros três irmãos. Na faculdade, escolheu o curso de direito porque queria ser promotora e achava bonita a profissão. Em meados dos anos 90, foi estagiária do Ministério Público em um presídio estadual que existe até hoje no bairro Quinta da Boa Vista, o Evaristo de Moraes, popularmente conhecido como Galpão da Quinta. Na época, seu lema era “bandido bom é bandido morto”. “Mas a advocacia criminal me arrebatou e trouxe um conhecimento de mundo que mudou tudo”, lembra. No Galpão da Quinta, a população carcerária era de presos considerados “pequenos”, “desses sem dinheiro, que fazem hora extra na cadeia e terminam a vida ali, esquecidos”.

As absolvições no Galpão ganharam repercussão e chegaram aos ouvidos de chefes de comunidades cariocas. Esses homens, os líderes do tráfico, Flávia aprendeu a chamar de “donos dos morros”. Já eles, aprenderam a chamá-la de “doutora”. Foi em 1999, aos 24 anos, que defendeu e soltou seu primeiro grande cliente do tráfico, Jorge Zambi, o Pianinho, um dos criadores do Terceiro Comando, facção também com base no Rio de Janeiro. “Quando o liberei, os grandes não pararam de me procurar. A partir daí e até então, só teve uma grande facção em que ainda não atendi a ninguém, a Okaida [de Pernambuco e para qual Flávia só não advogou ainda por falta de oportunidade].” No mais, defende ou já defendeu líderes de todas as outras: Amigos dos Amigos, Terceiro Comando, Comando Vermelho e Primeiro Comando da Capital (que atua em São Paulo, mas tem braços em outros 22 estados brasileiros e até em países próximos como Bolívia e Paraguai).

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